Eu lembro de tê-la visto pela primeira vez há sete anos atrás. Era pequena, mas esguia. Via-se que se tornaria uma menina alta. Reencontrei-a no ano passado, enquanto cobria a licença de uma professora. Algumas vezes matava a aula. Estudava à noite e, imagino eu, preferia jogar vôlei ao invés de ouvir um cabeludo falando sobre Segunda Guerra Mundial.
Ela foi minha aluna no sexto e no terceiro ano. O primeiro do fundamental e o último do médio e a distância temporal não me deixou dúvida: eram a mesma pessoa. Tanto a menina quanto a moça eram queridas e espertas. Inteligentes, dá pra se dizer... Educadas no trato... Uma aluna daquelas que a gente chama no corredor pra perguntar como andam as coisas!
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O sexto ano em que a conheci era um terror. Dos trinta, uns vinte eram muito doidos. No meio da loucura, vez que outra eu extraía alguma coisa. O professor que se mantém são num sexto ano é um verdadeiro herói. Vai pro céu, como se diz... Eu confesso que até gostava. Tinha bons alunos naquela turma. Ela, principalmente!
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Depois, no terceiro ano, já cansada, via-se uma pessoa mais madura e em busca dos últimos prazeres da convivência escolar. Acho eu que trabalhava durante o dia, pois estava sempre com aquela cara de quem acordou cedo e não teve tempo para uma sesta. A idade adulta batia a sua porta...
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Andei pensando e pensando depois de uma constatação avassaladora: perguntei nas turmas que tenho na escola pública: “quantos aqui querem fazer o vestibular no final do ensino médio?” Oitenta por cento levantaram a mão, para a minha surpresa. Segui: “Tá, vem cá, quantas redações vocês já fizeram no ensino médio?” A maioria ficou olhando para o nada. “Nenhuma, professor!”. Nenhuma.
NENHUMA.
Essa história eu vou contar em outro texto, mas ela me deixou pensativo o suficiente para perder o sono.
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Mas então encontrei a Milena.
Eu estava na escola, na última sexta-feira, morto de cansado e vi ela meio de longe. Fui me aproximando e disse, “fazendo o quê aqui, Guria?”, e ela respondeu, “Vim pegar meus documentos...consegui uma bolsa de cem por cento para estudar Cinema!” e os seus olhos brilhavam e o seu sorriso se abria. Involuntariamente, todos os pelos do meu corpo de arrepiaram e eu dei um abraço nela. Mal consegui expressar minha alegria, mas sei que ela percebeu o quanto fiquei feliz – bastava reparar o brilho recíproco do meu olhar.
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Parecia cena de cinema, mas era a realidade, e à noite, consegui dormir...