Cruzei com ele, o William. A primeira coisa que reparei foi a cara de adulto, já que não tinha a visto por completo. Apesar de permanecer no segundo ano do ensino médio pela segunda vez, ele não desiste, segue...
Em 2021, em meio à pandemia com ensino híbrido, ele foi meu aluno. Não via seu rosto direito, por causa da máscara. Aquela metade de anonimato só deixava os olhos à vista - apesar de que, o malandro sempre puxava a máscara para baixo e lançava perdigotos nas sonoras risadas...
O William era um aluno legal! No meio da tensão pandêmica, ele se divertia. Tinha um senso de humor original e autêntico, ou seja, não tinha medo. Pessoas com senso de humor têm menos medo do mundo, é o que eu penso... O William era uma dessas pessoas...
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No dia do meu aniversário ele apareceu no final da aula e me ofereceu cinco reais - durante a aula ele tinha ficado na quadra jogando vôlei, sua paixão física. "Ó professor, não tive tempo de comprar o teu presente, mas compra um BIS pra ti...".
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(Eu lembrei da história do Bolaños, o Chaves, que numa parada em uma rodoviária na Venezuela foi abordado por um menino que vendia balas dentro dos ônibus. O menino ficou petrificado quando se deu conta que na sua frente estava o seu herói, El Chavo del ocho. Ele tirou todo o dinheiro que tinha ganhado vendendo balas e ofereceu ao Bolaños e disse, "Chaves, pega o dinheiro para comprar um sanduíche de presunto!". O Bolaños, sabiamente, aceitou o dinheiro, sem deixar a fantasia se perder em meio ao mundo real. Provavelmente tenha sido o dia mais feliz do menino!)
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O Bolaños era gênio e os gênios sabem o que fazer quase que por instinto. Digo isso porque eu recusei os cinco pilas que o William me ofereceu. Na minha cabeça, aquilo faria falta no seu orçamento... Tolice minha, deixei o mundo real se sobrepor à fantasia. A alegria do meu aluno seria muito maior em oferecer a seu professor um presente, mesmo que fosse uma simples caixa de chocolates.
Voltei embora e só consegui refletir a respeito da minha atitude horas depois. Como fui tolo!
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Mas aprendi várias coisas. Primeiro, nunca se recusa um presente. Segundo, a genialidade é espontânea - o gênio se conhece no detalhe. Terceiro, as relações de afeto estão em todos os lugares e o protocolo das relações sociais nem sempre são racionais - quero dizer, a relação professor e aluno, institucionalmente falando, se perde quando um aluno te oferece cinco reais para comprar um presente no dia do seu aniversário.
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Bom, o meu presente foi o aprendizado.
E, William, valeu Bixo, valeu!
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E você, que lições tiraria dessa história?
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